A Casa de Saúde Santa Marcelina, de São Paulo (SP), foi condenada pela Justiça do Trabalho a pagar R$ 150 mil de indenização por danos morais a um vice-diretor clínico que sofreu ações criminais e cíveis após divulgar uma carta aberta a ex-colegas e funcionários sobre o real motivo de sua demissão. A Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho negou provimento a agravo da instituição, que pretendia rediscutir a condenação.
O médico disse que apontou irregularidades cometidas por dois colegas de trabalho contra o Sistema Unificado de Saúde (SUS). Segundo seu relato, os médicos agenciavam pessoas que pretendiam se submeter à cirurgia bariátrica (redução de estômago), encaminhando-as para seus consultórios particulares e, posteriormente, ao hospital, onde eram submetidas ao procedimento pago pelo SUS sob outro registro, e cobrando valores de R$ 4 a R$ 7 mil, “para não aguardarem na fila de espera”.
Ainda de acordo com sua argumentação, o hospital se recusou a apurar os fatos e afastar os supostos envolvidos e, em dezembro de 2002, o demitiu, “como forma de abafar o esquema de corrupção e fraude contra o SUS”. Na época, ele era vice-diretor clínico, chefe da cirurgia geral, vice-presidente da Comissão de Ética e perito no Departamento Jurídico, e a demissão sumária teria gerado rumores de que ele é que seria responsável por atos ilícitos.
Tendo as acusações se voltado contra ele, decidiu escrever uma carta aberta sobre as “verdadeiras razões de sua demissão”. O caso foi parar nos jornais, e o profissional afirmou que sofreu diversas ações criminais (das quais foi depois absolvido) por parte do hospital, diretoras e médicos acusados, que lhe atribuíam a autoria das matérias publicadas.
Segundo ele, o mais doloroso foi ter sido processado pelo hospital que ajudou a construir durante 27 anos de trabalho. A reclamação trabalhista foi movida contra o hospital e duas de suas diretoras.
O juízo da 87ª Vara do Trabalho de São Paulo condenou o hospital a pagar indenização de R$ 150 mil, e as duas diretoras em R$ 75 mil, cada. O Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP) reconheceu que o médico foi acusado injustamente em retaliação à divulgação da carta aberta, e que teve “comportamento honesto e corajoso ao buscar apurar irregularidades e punição dos envolvidos”. Contudo, julgou excessivo o valor da condenação e acolheu recurso do hospital e das diretores para reduzi-lo à metade.
TST
No recurso para o Tribunal Superior do Trabalho, o hospital apontou que, segundo o próprio TRT, o médico não provou as irregularidades por ele denunciadas, que “afetaram as imagens da instituição e a honra das duas diretoras”. Para a defesa, as diretoras, ao mover as ações criminais, apenas exerceram seu direito de ação, garantido constitucionalmente.
O relator, ministro Renato de Lacerda Paiva, explicou que a “prova” do dano moral é a existência do próprio fato danoso – a partir do qual se presume sua existência, “fruto de intuição, capacidade de qualquer um num exercício de empatia e que, munido de alguma imaginação, conclui pela possibilidade de sofrimento psíquico pelo outro”. Assim, supor a existência ou não do dano moral só é possível “porque os indivíduos partilham da mesma condição humana e, em última análise, quase sempre sofrem, em maior ou menor grau, pelos mesmos motivos”.
Redução
O hospital também pediu a redução do valor da condenação, “mais condizente com a situação financeira da entidade”. Mas o relator alertou que o pedido de se observar os critérios de razoabilidade e da proporcionalidade sequer abordou os fatos que ensejaram o pedido de indenização por danos morais. Por unanimidade, a Segunda Turma manteve a condenação no valor total.
Processo: AIRR-65700-64.2006.5.02.0087