Considerando que é impossível estabelecer com absoluta certeza o local e momento de contaminação por COVID-19 e, considerando o maior grau de exposição dos profissionais de saúde, não há que se impor ao trabalhador o ônus de comprovar que sua infecção foi ocupacional, por ser oneroso demais, caracterizando-se como prova impossível.

Não podemos desconsiderar que são graves os efeitos da pandemia de COVID-19 e que estamos diante de um aumento nos casos de infecção no Estado.

Também, é preciso ressaltar o risco elevado dos profissionais da saúde que laboram diretamente com os infectados em serem também contaminados.

Os profissionais da saúde merecem todo o respeito da sociedade e toda a proteção do Estado, diante dos desafios diários que passam todos os dias a enfrentar esta pandemia que assola a humanidade.

Quanto ao reconhecimento do COVID-19 como doença ocupacional, o Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria dos votos, fixou a possibilidade de caracterização desta doença como de origem ocupacional, ao suspender a eficácia do artigo 29 da Medida Provisória nº 927, especialmente no caso dos trabalhadores da saúde.

Importante destacar que o art. 169 da CLT determina a emissão da comunicação de acidente do trabalho (CAT) mesmo em caso de suspeita de relação causal entre a doença e o trabalho, justamente porque há hipóteses em que o risco está fortemente presente na atividade, como é o caso dos trabalhadores da saúde.

Ademais, exigir a comprovação da existência de nexo causal entre a doença e o trabalho, no caso de vírus, seria impossível, pois como provar que o vírus que infectou o trabalhador não foi transmitido no local de trabalho? Portanto, plausível que os profissionais que estão na linha de frente trabalhando diretamente com os infectados da Covid-19, acaso contaminados, o tenham sido em razão do trabalho, presumindo-se a causalidade entre a doença e o trabalho.

Neste sentido, conclui com maestria, o Dr. José Antônio Ribeiro de Oliveira Silvai, em seu estudo publicado na Revista LTr nº 84 de junho de 2020 (“A COVID-19 COMO DOENÇA OCUPACIONAL: NEXO CAUSAL E CONCAUSAL” – P. 752):

Em síntese, pode-se apontar que, nesse período caótico pelo qual está passando a humanidade, em razão da pandemia de COVID-19, aos trabalhadores das atividades essenciais, o Direito tem de oferecer a máxima proteção, pois são eles que estão mantendo a economia funcionando, ainda que precariamente e, acima de tudo, estão prestando a atenção sanitária às vítimas do insidioso vírus, em hospitais, farmácias e demais estabelecimentos da área da saúde, bem como nas tantas atividades realmente essenciais.

Não é razoável que o Estado e a sociedade, principalmente pela atuação do Judiciário, não confiram a máxima eficácia à normativa de proteção ao bem maior de todo e qualquer trabalhador: sua saúde laboral, uma extensão de seu próprio direito à vida. Contudo, acidentes ocorrerão e doenças serão adquiridas nesse triste período, inclusive a COVID-19.

Ocorre que o trabalhador não terá condições de comprovar que adquiriu essa doença por ocasião do exercício de seu trabalho.

Ora, quando está presente, na colisão de direitos, o direito à saúde do trabalhador, não há como se estabelecer juízo de ponderação. A saúde deve prevalecer, sempre. Daí que se pode extrair uma ratio decidende desse precedente do STF, em matéria de ônus da prova: a inconstitucionalidade de qualquer norma definidora de ônus da prova em matéria de doença ocupacional, que venha a exigir do trabalhador o ônus de comprovar o nexo causal entre o trabalho e a doença, quando ele estiver a laborar com elevada exposição ao contágio, como ocorre nas atividades essenciais. Esse nexo de causalidade deve ser presumido, “invertendo-se” o ônus da prova, tendo o empregador de demonstrar a situação inversa: que a doença foi adquirida em outro local ou momento, não durante a prestação de serviços.

Entendemos que não existe fundamento para não emissão de CAT pelos empregadores.

Reconhecendo-se a existência de doença profissional, não protege apenas os empregados, mas também aos empregadores, pois lhes exigem uma postura mais proativa no combate à disseminação da doença entre os trabalhadores, com a adoção de medidas mais firmes de prevenção à Covid-19.

Nesse contexto, a emissão da CAT é direito do trabalhador contaminado pela COVID-19, considerando o inequívoco aumento do risco de contaminação por se tratar de empregados de empresa que prestam serviços médicos.

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