“Ficávamos no meio do mato. A gente acendia fogueira para espantar as onças. Minha mãe chorava dia e noite quando soube que quem ia pra lá não voltava mais”. A declaração de Erivaldo de Freitas Cruz, 38 anos, retrata uma das facetas perversas do trabalho análogo à escravidão. Ele foi um dos 24 trabalhadores resgatados de propriedades do fazendeiro Gilberto Andrade no Maranhão e Pará, nos anos de 1998 e 1999. Quase 17 anos depois de reencontrar a liberdade, ele e outros dois trabalhadores estiveram na sede do Ministério Público do Trabalho no Maranhão (MPT-MA) para confirmação de dados pessoais e liberação de crédito trabalhista por alvará judicial.

Hoje Erivaldo é casado, mora em Goiânia (GO) e trabalha com carteira assinada num agropolo produtor de cimento e capim. Realidade bem diferente da que ele viveu quando trabalhava na fazenda onde foi resgatado, em Carutapera (MA). Ele e os demais trabalhadores estavam alojados em barracas de lona, tinham alimentação precária, estavam submetidos a jornadas exaustivas de trabalho, eram impedidos de deixar a propriedade, não dispunham de banheiro e nem luz elétrica, e a água que bebiam era de um igarapé.
“Recebíamos milharina, arroz e feijão. Carne só de vez em quando. Para não passar fome, a gente caçava paca e tatu. Durante todo o período que ficamos no mato, a gente não recebeu nenhum dinheiro”, lembrou Erivaldo.

Quem também viveu essa experiência foi Del Rubens Lopes (33), na época com apenas 17 anos, e o pai dele, João Fermino Lopes, hoje com 60 anos. Eles foram atraídos para a fazenda por um “gato”, que atua como aliciador de trabalhadores. “A promessa era de dinheiro bom, mas, quando chegamos lá, vimos que era tudo diferente”, lamenta Del.

Erivaldo, Del e João e os demais trabalhadores foram resgatados pelo Grupo Móvel de Fiscalização, formado por representantes do MPT, Superintendência Regional do Trabalho e Emprego e Polícia Federal. “Quando a gente saiu da fazenda foi como nascer de novo. Os nossos parentes ficaram muito felizes”, ressaltou João Fermino. Atualmente, ele vive num assentamento em Paragominas (PA) e atua como autônomo. O filho, Del Rubens, mora na mesma cidade e trabalha como vaqueiro. “Com carteira assinada, tudo certinho”, fez questão de destacar. Os três sobreviventes já sabem como irão investir o dinheiro recebido. Del e Erivaldo pretendem reformar a casa. João Fermino quer construir uma nova moradia.

Desde que o crédito trabalhista foi liberado, o MPT no Maranhão iniciou o árduo trabalho para localizar os trabalhadores que têm direito às verbas. Além do trabalho em conjunto com varas trabalhistas e Ministério Público do Pará, houve divulgação em rádios comunitárias, além de diligências em diversas cidades a fim de encontrar os resgatados. “Os fatos que deram origem à ação ocorreram há mais de 16 anos, o que dificulta a localização desses trabalhadores”, explicou a procuradora-chefe do MPT-MA, Anya Gadelha Diógenes.

O pagamento do crédito trabalhista é fruto de uma ação civil coletiva (nº 02624.2000.003.16.00.1), ajuizada pelos procuradores Maurício Pessôa Lima e Virgínia de Azevedo Neves.

Até agora, 11 trabalhadores tiveram acesso aos recursos. Outros 13 (veja a lista abaixo) ainda precisam se habilitar na 3ª Vara do Trabalho de São Luís para ter acesso às verbas.

 

Fonte: www.prt16.mpt.gov.br

Posts Relacionados